quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Declaração de guerra ao Verdana

Chega! Não vou ficar mais calado!
E começo por corrigir o título deste post que deveria ser: "Declaração de guerra à má utilização do Verdana".
Como alguém (cujo nome não sei mas gostava muito de saber) disse : Não existem nem maus nem bons tipos de letra: existem é más utilizações dos tipos.
Já toda a gente sabe que a maioria dos designers têm dois grandes ódios de estimação: o Arial e o Comic Sans. O primeiro porque é um clone (e muito mal feito) do Helvetica e o segundo porque foi desenhado para balões de um personagem que era o cão da Microsoft (o Microsoft Bob) e é usado em situações muito diferentes das dos balões de banda desenhada (porque não dizê-lo: até nos convites oficiais feitos pela direcção do instituto onde lecciono para, por exemplo, a abertura solene das aulas...).

Permitam-me acrescentar o Verdana. E por razões semelhantes às do Comic Sans.
Mathew Carter (type designer e autor do Verdana) fez um trabalho excelente ao desenhá-lo. Estava a responder a uma encomenda da Microsoft e cujo objectivo era fazer um novo tipo adaptado ao ecrã e
, sobretudo, cuja legibilidade conseguisse resistir aos corpos pequenos, coisa que os tipos de letra comuns não faziam (pois não eram optimizados para a trama de pixels do ecrã).
Matthew Carter em vez de desenhar um tipo de letra sem restrições de desenho e que seria depois adaptado para os pixeis do ecrã (como a esmagadora maioria dos tipos existentes), teve a brilhante ideia de começar por desenhar as letras com pixels para depois as “embrulhar” com as necessárias curvas e formas típicas de um tipo de letra.
Matthew Carter conseguiu desenhar um tipo que se comportava muito bem nos
corpos mais pequenos (em ecrã, ok?). À medida que se aumenta o corpo, porém, começa a notar-se o seu verdadeiro desenho. Veja-se a imagem em tamanho real.
Impresso em papel então é inenarrável. Sejamos sinceros: o Verdana não é um tipo harmoniosamente desenhado. As suas curvas são grosseiras e muitas das partes da letra não combinam entre si. Não porque Carter não soubesse como desenhar formas harmoniosas, mas pela função a que se destinava.
O próprio nome começa a mudar à medida que se aumenta o corpo e criam-se dois segmentos de recta verticais: um antes e outro depois do V (isto é uma private joke para os meus alunos).

Portanto, o |V|erdana como tipo de letra oficial do Ikea não convence ninguém.
Espírito Ikea (diz o MUPI)?
Já tinha havido bastante polémica quando resolveram mudar o tipo Futura do seu famosíssimo catálogo
(tipo de letra marcadamente modernista e que reflecte bastante do espírito do mobiliário Ikea) para Verdana e eu estive caladinho. Agora é demais: Nos anúncios? Na sua comunicação oficial? No espírito Ikea? Deve ser um espírito "tosco" e desproporcionado, no mínimo.

Volto a dizer: Mathew Carter (coitado) não tem culpa nenhuma.
Sou grande admirador dele e é o autor do provavelmente único tipo de letra igualmente legível e elegante tanto em ecrã como em papel: o Georgia que é o deste parágrafo
(para quando uma versão do Georgia com Lining Figures, Mathew?!).
Viva Mathew Carter!
Fora quem não sabe utilizar bem o Verdana.

(e desculpem lá a extensão deste post...)

8 comentários:

  1. Realmente é verdade. Para quem gosta de um trabalho bem feito, e está bem inserido no contexto do design gráfico, é irritante ver as coisas correrem desta forma.
    Tipos de letra para ecrã, e não servem para impressão, logicamente, os próprios designers deveriam utilizá-los para o que foram criados. Neste caso a Verdana, é para ecrã, e numa instituição como o IKEA, usarem este tipo de letra para impressão, é realmente estranho. Deixa a desejar muito em termos de profissionalismo, pois mostra falta de informação em relação ao uso dos tipos de letra, o que é uma coisa básica, que se aprende logo no início do percurso de um designer gráfico.
    É uma coisa que tenho visto muito ultimamente, e realmente sinto que é asqueroso, é meterem pessoas sem qualquer cultura e formação, com a mania que são designers, a fazer certos trabalhos, só para não terem que pagar a uma equipa de criativos profissional, que sabem realmente aquilo que fazem.
    Já agora, uma mensagem ao professor Moreira, o titular deste blog. O blog é mesmo feito para criticar e aprender, não peça desculpa pelos erros dos outros. Não tenha medo de ferir susceptibilidades. Com peso e medida, às vezes é a única forma de abrir a pestana a algumas pessoas. E fica-lhe bem o nome |V|erdana LOL pelo menos neste caso.

    TSR - DTAG

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  2. Luís — como type designer e amante da Tipografia —, compreendo perfeitamente o teu ponto de vista e até certo ponto partilho da mesma opinião. Mas estando também envolvido na indústria do software, percebo por que é que a Ikea, uma empresa multinacional, tomou esta decisão. Eis o desafio: escolhe uma família tipográfica (Reg/It/Bd/BdIt) que suporte uma multiplicidade de línguas (desde as europeias* às asiáticas, passando pelas do Médio Oriente — lista completa em http://www.ikea.com/), esteja facilmente disponível dentro e fora da empresa, seja legível e simples (como os artigos da Ikea) e possa ser usada eficazmente tanto no écran como para impressão?
    *incluíndo grego e búlgaro, que são duas línguas oficiais da União Europeia e que não utilizam o alfabeto latino.

    Quantos nomes é que te vêm à cabeça? Acredito que não serão muitos, pois não?

    A minha primeira reacção quando soube que os catálogos da Ikea iriam passar a ser impressos com o Verdana foi exactamente igual à tua. Fiquei incrédulo. Até pensei mesmo que era uma piada do Primeiro de Abril. Mas agora compreendo muito melhor a decisão, e consigo perceber como é que o uso do Verdana pode tornar a imagem e a marca/brand Ikea muito mais coesa tanto on-line como off-line.

    De qualquer forma, continuas a ter toda a razão: o Verdana que conhecemos hoje é horrível quando usado em corpos grandes. Mas não desesperes pois as coisas vão mudar:

    "Enhancements to Georgia & Verdana Typeface Families Announced — The Ascender, Carter & Cone and Font Bureau project intends to optimize the Verdana and Georgia fonts for many new applications, including extended text formatting on websites and in print."
    http://www.ascendercorp.com/pr/2009-09-08/

    Já agora, vê a discussão no Typophile: http://typophile.com/node/61222

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  3. Realmente, assim já se compreende um bocado mais da lógica da situação.

    TSR - DTAG

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  4. Não esperaria outra coisa de ti, Miguel.
    (algo me dizia que ias dizer qq coisa de profundo em resposta a este post)
    You're the greatest. Obrigado pela informação. Continuo é a não gostar do Verdana e não acredito que tu (mesmo admirando o MC como eu admiro) consigas gostar de ver o Verdana ampliado e impresso.
    Terias de ter sido brainwashed... eu teria, de certeza.
    eh eh eh
    Um enorme abraço cá da velha Europa.

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  5. ok, tudo bem sr. professor! concordo com tudo que disse, mas realmente.... não sei se desculpo a questão da extensão do post. é um bocado demais, não? :)
    (ainda estive a ver se tinha erros, mas não!)

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  6. Acho que tudo isto, porque todos pensavam que o IKEA acreditava no bom design para todos…

    Acho que este tema tem pano para mangas, o IKEA sempre foi de fazer design simples, limpo, apelativo e de baixo custo. Deve ser então aí que entra a parte do usar o tipo de letra quer em ecrã, quer em papel; fica barato, funciona internacionalmente como disse o Miguel. Mas usemos as coisas para as quais foram feitas.

    Eu sei que o comum do mortal que entra no IKEA nem queira saber que tipo de letra é aquele, ou não interessa, ou nem sequer vê os cartazes com a pressa que vai. Ainda assim, acho que um tipo de letra acaba por ser a 'voz' de uma empresa independentemente se ninguém sabe que letra é, ou se fica bem, ou se é legível; o facto é que o seu objectivo (do tipo de letra) é adequar-se à empresa e que ela transmite a mensagem da mesma.

    Não sei porquê tirar a Futura e a Century Schoolbook, a Futura penso que correspondia bem àquilo que é o IKEA: Racional, simples, limpo, preciso e moderno. É simples, é recto, mas é bom.
    Com a Verdana acho que nos estão a dizer: "Ninguém nota"

    Factos:

    A Verdana, como se sabe foi feita para se ver em ecrãs, as espessuras e a sua 'geometria' que até ajudam no ecrã, impresso distraem. Multilíngue.

    A Futura não dava conta do recado? Ela embutida ou criada como imagem, aguenta bem no cabeçalho do website, (não?). Depois sim podia-se usar a Verdana para complementar (ou a Arial [sarcasmo]) a ser usada no texto. Pelo menos a personalidade do IKEA estava lá.

    Assim, o único argumento que sustenta a Verdana é mesmo ter uma vantagem no conjunto de caracteres no que toca a multíplas línguas.


    Eu já 'assinei', quem também o quiser fazer: http://www.petitiononline.com/IKEAVERD/petition.html

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  7. Encontrei outro caso de utilização inadequada da Verdana. Deparei-me com tal na revista Pais & Filhos. A revista apresenta a letra na capa da revista. No interior usam a Helvetica, Times e Bodoni. Não podiam ter usado a Helvetica na capa? É que só para usar uma vez e na capa…

    Vejam por vocês mesmos
    http://img249.imageshack.us/img249/4613/kpf229.jpg

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  8. gostava de ler a sua opinião sobre o novo logo da son ai (dei um tiro no pé).
    sónia

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